domingo, 22 de dezembro de 2013

Carl Sagan fala sobre a ciência

Podemos  rezar  pela  vítima  do  cólera,  ou  podemos  lhe  dar quinhentos miligramas de tetraciclina a cada doze horas. (Ainda existe uma religião, a ciência cristã, que nega a teoria que atribui as doenças a micróbios; se a oração não produz efeito, o fiel prefere que os filhos morram a lhes dar antibióticos.) Podemos tentar a quase inútil terapia psicanalítica pela fala com o  paciente  esquizofrênico,  ou  podemos  lhe  dar  trezentos  a  quinhentos miligramas de clazepina. Os tratamentos científicos são centenas ou milhares de  vezes  mais  eficazes  do  que  os  alternativos.  (E,  mesmo  quando  os alternativos parecem funcionar, não  sabemos  realmente  se  desempenharam algum  papel:  melhoras  espontâneas,  até  de  cólera  e  esquizofrenia,  podem ocorrer sem rezas e sem psicanálise.) Renunciar à ciência significa abandonar muito  mais  do  que  o  ar-condicionado,  o  toca-disco  CD,  os  secadores  de cabelo e os carros velozes.

Nos tempos pré-agrícolas dos caçadores-coletores, a expectativa de vida humana era cerca de 20...30 anos. Essa era também a expectativa de vida na Europa ocidental no final do Império Romano e na Idade Média. Ela só aumentou para quarenta por volta de 1870. Chegou a cinqüenta em 1915, a sessenta em 1930, a setenta em 1955, e está se aproximando de oitenta hoje em dia (um pouco mais para as mulheres, um pouco menos para os homens). O resto do mundo está repetindo o incremento europeu da longevidade. Qual é a causa dessa transição humanitária espantosa e sem precedentes? A teoria microbiana  das  doenças,  as  medidas  de  saúde  pública,  os  remédios  e a tecnologia médica. A longevidade talvez seja a melhor medida da qualidade física da vida. (Se você está morto, pouco pode fazer para ser feliz.) Essa é uma dádiva preciosa da ciência à humanidade ? nada menos do que o dom da vida.

(Carl Seagan em O Mundo Assombrado Pelos Demônios, pgs. 17 e 18)