Podemos rezar pela vítima do cólera, ou podemos lhe dar quinhentos miligramas de tetraciclina a cada doze horas. (Ainda existe uma religião, a ciência cristã, que nega a teoria que atribui as doenças a micróbios; se a oração não produz efeito, o fiel prefere que os filhos morram a lhes dar antibióticos.) Podemos tentar a quase inútil terapia psicanalítica pela fala com o paciente esquizofrênico, ou podemos lhe dar trezentos a quinhentos miligramas de clazepina. Os tratamentos científicos são centenas ou milhares de vezes mais eficazes do que os alternativos. (E, mesmo quando os alternativos parecem funcionar, não sabemos realmente se desempenharam algum papel: melhoras espontâneas, até de cólera e esquizofrenia, podem ocorrer sem rezas e sem psicanálise.) Renunciar à ciência significa abandonar muito mais do que o ar-condicionado, o toca-disco CD, os secadores de cabelo e os carros velozes.
Nos tempos pré-agrícolas dos caçadores-coletores, a expectativa de vida humana era cerca de 20...30 anos. Essa era também a expectativa de vida na Europa ocidental no final do Império Romano e na Idade Média. Ela só aumentou para quarenta por volta de 1870. Chegou a cinqüenta em 1915, a sessenta em 1930, a setenta em 1955, e está se aproximando de oitenta hoje em dia (um pouco mais para as mulheres, um pouco menos para os homens). O resto do mundo está repetindo o incremento europeu da longevidade. Qual é a causa dessa transição humanitária espantosa e sem precedentes? A teoria microbiana das doenças, as medidas de saúde pública, os remédios e a tecnologia médica. A longevidade talvez seja a melhor medida da qualidade física da vida. (Se você está morto, pouco pode fazer para ser feliz.) Essa é uma dádiva preciosa da ciência à humanidade ? nada menos do que o dom da vida.
(Carl Seagan em O Mundo Assombrado Pelos Demônios, pgs. 17 e 18)
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